Voltamos para a sede pelo caminho do Aterro e aí vemos uma aglomeração e resolvemos parar. Vários carros de polícia, ônibus retidos, gente sendo revistada. A repórter vai perguntar o que está acontecendo e eu, achando que é só mais uma blitz rotineira, encosto-me num carro e fico observando de máquina em punho.
Vejo que os policiais estão vasculhando a parte de cima e a de baixo dos biquínis das mulheres. Começo a fotografar como quem não quer nada e como se fosse tudo muito normal. Um sargento ao meu lado, já de papo, diz que todo domingo é assim, os ônibus vêm cheios da praia, acontecem vários furtos, os assaltantes mandam as mulheres colocarem os cordões, anéis, dinheiro, dentro das roupas de banho...
Do outro lado, percebo um policial me olhando e antevendo a situação, rapidamente rebobino o filme, tiro-o da máquina, coloco dentro da minha calcinha. Ponho logo outro na máquina e continua tudo igual...
Começa um certo rebuliço, o sargento é questionado pela repórter, como é que se faz uma revista quase ginecológica nas mulheres, à vista de todos, em plena luz do dia... A atitude dos policiais muda e o sargento vem me perguntar o que nós estamos fazendo lá também...
- Eu, nada... Só estou olhando...
- Pois então não pode. Fotografou alguma coisa?
- Eu não!!!
Vem o policial do outro lado e afirma:
- Fotografou, que eu vi!
- Eu?
- É! Passa a máquina para cá!
- A máquina? Não posso! O equipamento não é meu, é do Jornal!
- Jornal, coisa nenhuma!!! Passa para cá!
- Não posso!
- Então vai entrando na patrulhinha que o delegado vai resolver isso.
- Patrulhinha? Estou presa?
- Entra logo!!!
Entrei e a repórter também, que estava tão nervosa quanto eu.
O motorista do Jornal gritava:
- Vou atrás de vocês!!!!
Fomos para a 9ª DP, ali no Catete. O mau humor dos policiais era compatível com o enfado do delegado de plantão. Calor, verão, domingo à tarde... Todo mundo entrou já quase aos gritos... O Delegado, pedindo calma, pergunta que bagunça era aquela e logo me colocam como o pivô da situação. Não podia estar lá, tinha feito fotos, tinha que entregar o filme... Eu respondo que não tinha feito nada, e que também não podia entregar o material que afinal, não era meu.
O Delegado fala com a repórter, pede que seja boazinha, pra resolver logo aquela situação. Ela responde que não pode. Ele manda ligar para o Jornal. Liga e pede pra falar com o Editor. Vem uma mulher e ele exige:
- O EDITOR!!!!
Ela responde que ela é a Editora!!!... O Delegado suspira:
- Só tem mulher!!! Assim não dá...
Para terminar logo, olha-me olha no fundo do olho e pergunta:
- Tem certeza que não fotografou?
- Claro que não!!! Não estou nem aí!!!
Os policiais babam de raiva e o delegado manda acabar com aquilo tudo, enxota todo mundo pra fora da delegacia. Lá fora, o motorista nos recebe com alívio.
Chegamos na redação, revela-se o filme e o Xico Vargas (aí, sim, chegou um homem, para a editoria da tarde) fica entusiasmado com as fotos e resolve dar na primeira página. A adrenalina estava a mil, as fotos ótimas, mas ficava aquela sensação desconfortável, um certo medo de dar de cara com os policiais no dia seguinte.
A foto saiu na primeira página, grande, no topo.
Mabel Arthou > Tendo estudado Direito até o quarto ano, começou a fotografar como hobby. Fez cursos de Fotografia na Corcoran Gallery em Washington, D. C. e na Galeria Ateneo, em Montevidéu, Uruguai.
Profissionalizou-se ao começar uma parceria com o correspondente do Washington Post para a América Latina, tendo suas primeiras fotos publicadas nesse Jornal.
Em 1980 entrou para o JB, em Brasília, tendo dois anos mais tarde se mudado para o Rio, onde passou o resto da década de 80 trabalhando na reportagem do Jornal do Brasil.
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